sábado, 18 de fevereiro de 2012

Anotações


Interlocução x interlocutores



Escuto e escrevo  no meu caderno de anotações:  O pintar como arquitetura de um espaço”,  frase de Sergio Fingermann;  frase grifada ao longo  destas orientações, sempre dita e redita,  perseguindo este fazer , como um ar sonoro, um beliscão na pele, um cisco no olho. Frase que se constrói neste fazer:  O que é este espaço de arquitetura de uma tela? O que representa a Tela? Onde está a parte desta memória e do sensível ? O que diz esse Pintar?.



Indagações que nos mostraram um outro modo de ver, um exercício de construção, de olhar e de ter gestos lentos; o que se consegue ver numa tela está na possibilidade de manter-se à distancia,  e  mudando-se sempre de distancia, de lugar e, afastando-se da tela, alteramos o foco, sempre ser o viajante e  viajar nesta procura de olhar.  A tela, diz ainda Sergio F., pede e sugere o seu tempo acumulado, onde ao aprisionar o olhar neste fazer nos dá o todo do trabalho; o trabalho na experiência, onde a tela  guarda sua linguagem dilatada no tempo desta espera e afastamento.

Nuances e questionamentos que se dissolvem na tela. Estão lá e não estão, tudo se constrói e se esvai ao mesmo tempo. Pintar é estar nesta flutuação perpétua e incerta, na busca daquilo que foge:  “O que está “entre” não se vê”, outra frase, outra experiência que se abrem diante dos meus olhos.  Se a imagem é um artifício, o que se vê? O que se faz?, se pintar é estar distraído ou rigidamente atento? Onde sou quando vejo?

Apreendo em meu fazer que “ A tela é um Palco”, que se faz na estratégia de um diretor, de tirar, subtrair tudo o que se reveste nas formas deste ver, e de organizar o visível, aquilo que se quer mostrar, e neste trabalho de foco e subtração, onde esta a luz?. Se a pintura pode ter e ser esse espaço de arquitetura, cores e formas sobem à cena para revelar suas encenações, e você como diretor, sabe priorizar o que  quer ser dito?



“ A poesia da pintura está na criação da ilusão”, “ Todo desenho é uma sombra ao redor  da luz, onde o tempo dilatado se faz” (Fingermann). Sempre adiar a forma, abstrair o tempo no gerúndio, procure a espessura da obra  que nunca, nunca  está na tendência, “ mas nas sua poética pessoal”.

 O conteúdo da arte não está na imagem- mas além dela”.  E assim fui anotando, e assim fui construindo , percorrendo o meu processo, e aprendendo que o que pintamos não se vê, está entre a pintura e este fazer. Um desafio de eternas angústias neste espaço de arquitetura que tropeçamos com o ego, se não escutar com a alma.



quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Este fazer arte.... onde o verso é denso...


Arte Poética



A Poesia não me pede propriamente uma especialização, pois a sua arte é uma arte do ser. Também não é tempo ou trabalho o que  a poesia me pede. Nem me pede uma ciência  nem uma estética, nem uma teoria. Pede-me antes a inteireza do meu ser, uma consciência mais funda do que a minha inteligência, uma fidelidade mais pura do que aquela que eu posso controlar. Pede-me uma intransigência sem lacuna. Pede-me que arranque da minha vida que se quebra, gasta, corrompe e dilui como uma túnica sem costura. Pede-me que viva atenta como uma antena,  pede-me que viva sempre, que nunca me esqueça. Pede-me uma obstinação sem tréguas, densa e compacta.



Pois a poesia é a minha explicação com o universo, a minha convivência com as coisas, a minha participação no real, o meu encontro com as vozes e as imagens. Por isso o poema não fala de ma vida real, mas sim duma vida concreta: ângulo da janela, ressonância das ruas, das cidades e dos quartos, sombra dos muros, aparição dos rostos, silêncios, distância e brilho das estrelas, respiração da noite, perfume de tília e do orégão.

É esta relação com o universo que define o poema com o poema, como obra de criação poética. Quando há apenas relação com uma matéria há apenas artesanato.

É o artesanato que pede especialização, ciência, trabalho, tempo e uma estética. Todo poeta, todo artista é artesão de uma linguagem. Mas o artesanato das artes poéticas não nasce de si mesmo, isto é, da relação com uma matéria, como nas artes artesanais.

O artesanato das artes poética  nasce da própria poesia, à qual está consubstancialmente unido. Se um poeta diz: “obscuro”,  “amplo”, “ barco”, “pedra”, é porque estas palavras nomeiam a sua visão do mundo, a sua ligação com as coisas. Não foram escolhidas esteticamente pela sua beleza, foram escolhidas pela sua realidade, pela sua necessidade, pelo seu poder poético de estabelecer uma aliança. E é da obstinação sem tréguas que a poesia exige que nasce o “obstinado rigor” do poema.

O verso é denso, tenso como um arco, exatamente dito, porque os dias foram densos, tensos como arcos, exactamente vividos.

O equilíbrio das palavras entre si é o equilíbrio dos momentos entre si. E no quadro sensível do poema vejo para onde vou, reconheço o meu caminho, o meu reino, a minha vida.



Sophia de Mello Brekner Andresen. (in: Geografia. Lisboa, Salamandra, 1990)

contribuiçao: Juracy Giovagnolho dos Santos

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

O que carregamos?????


Hoje discutimos as tensões e contradições  do fazer “arte”. O estado de alerta para o presente,  que não é apenas uma necessidade ontológica,  é um desafio para um momento de pouca reflexão- nos quais a arte também participa, e, mesmo provoca.

Drummond, o poeta,  responde a esse desafio em sua obra. Poeta debruçado sobre as indagações da função da poesia no mundo; volta-se para a questão anterior à natureza e da essência da poesia. Como o pintor no seu processo de criação, e se indaga o que vêm antes desse pintar,  o que se carrega?

A arte de seu poema nos faz percorrer esse caminho, quando retira das coisas do esquecimento, dá-lhes forma, cor, tato e vértebra; escava sua argila; revelando/ocultando e desacreditando nas evidências em favor do jogo do “claro enigma”, que de luz e sombras  inscreve a imagem em movimento.

Este olhar que reveste-se de outros olhares: de presença-ausências,  ocultando ou revelando o seu objeto “coisa”: “ o que afinal carregamos” .)

“O tempo dilato do sensível no extraordinário, da ordem do incomum. Toda função artística opera tangenciando o tema ( que é sempre artifício), o que importa neste fazer sempre é o espanto” ( Sergio Fingermamm).

Assim é preciso ler o poema:

Carrego comigo

Carrego comigo

Há dezenas de anos
Há centenas de anos
O pequeno embrulho.

Serão duas cartas?
Será uma flor?
Será um retrato?
Um lenço talvez?

Já não me recordo
Onde o encontrei.
Se foi um presente
Ou se foi furtado.

Se os anjos desceram
Trazendo-o nas mãos,
Se boiava no rio,
Se pairava no ar.

Não ouso entreabri-lo.
Que coisa contém
Ou se algo contém,
Nunca saberei

Como poderia
Tentar esse gesto?
O embrulho é tão frio
E também tão quente.

Ele arde nas mãos,
É doce ao meu tato.
Pronto me fascina
E me deixa triste.

Guardar um segredo
Em si e consigo,
Não querer sabê-lo
Ou querer demais.


Guardar um segredo
De seus próprios olhos,
Por baixo do sono,
Atrás da lembrança.


A boca experiente
Saúda os amigos.
Mão aperta mão,
Peito se dilata.

Vem do mar o apelo,
Vêm das coisas gritos.
O mundo te chama:
Carlos!  Não respondes?

Quero responder.
A rua infinita
Vai além do mar.
Quero caminhar.

Mas o embrulho pesa.
Vem a tentação
De jogá-lo ao fundo
Da primeira vala.

Ou talvez queimá-lo:
Cinzas se dispersam
E não fica sombra
Sequer, nem remorso.

Ai, fardo sutil
Que antes me carregas
Do que és carregado,
Para onde me levas?


Por que não me dizes
A palavra dura
Oculta em teu seio,
Carga intolerável?


Seguir-te submisso
Por tanto caminho
Sem saber de ti
Senão que te sigo.

Se agora te abrisses
E te revelasses
Mesmo em forma de erro,
Que alívio seria!


Mas ficas fechado.
Carrego-te à noite
Se vou para o baile.
De manhã te levo

Para a escura fábrica
De negro subúrbio.
És , de fato,  amigo
Secreto e evidente.

Perder-te seria
Perder-me a mim próprio.
Sou um homem livre
Mas levo uma coisa.

Não sei o que seja.
Eu não o escolhi.
Jamais a fitei.
Mas levo uma coisa.


Não estou vazio,
Mas estou sozinho,
Pois anda comigo

Algo indescritível.





Carlos  Drummond de Andrade.





segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

A origem da obra de arte

A origem da obra de arte,
De Martin Heidegger.


Leitura sugerida para as discussões e reflexões sobre Arte, do grupo Contraponto.
O que é a obra de arte?
como uma coisa pode se tornar arte?

Estas são perguntas fundamentais quando se trata do fenômeno artístico. Afinal não podemos falar de "arte" sem nos remetermos à "obra de arte"
Na história da filosofia, há muitos filósofos que interrogam-se acerca da arte e do que a define. Para o filósofo alemão, Martin Heidegger, em seu livro: A Origem da Obra de arte, encontramos algumas destas reflexões, procurando mostrar que a Arte deve ser entendida pela perspectiva do que a "coisa" é, e para isso ele desmembra o conceito sobre "coisa" em três modalidades: quanto ao "suporte", a "unidade" dos sentidos, e a sua coisicidade ou "materialidade".


Origem significa aquilo a partir do qual e através do qual uma coisa é e o que é, e como é"
Segundo Heidegger, a origem de algo esta na sua essência, e a obra surge apartir e através da atividade Do artista - e é pela obra que se conhece o artista.

Mas o que é e como é uma obra de arte? Se:

Toda obra têm este caráter de coisa.
O monumento está na pedra.
A escultura está na Madeira.
O quadro está na cor.
A obra musical está no som.

O que define o ser de uma obra de arte?
Segundo Heidegger: a obra de arte é ainda algo de outro, para além de seu caráter de coisa.
Para Heidegger toda arte é um poema. Quando olhamos para os sapatos da camponesa de Van Gogh, os poemas de Hölderlin ou um templo grego, as representações que aí se mostram, podem nos revelar o outro lado das coisas, e utilizar o que vemos como ponto de partida para o sentido da Arte e sua essência.
Exemplificando essa transformação, o autor nos diz:
" Uma estátua em pedra será uma obra de arte ou uma pedra feita em arte?
A coisa- pedra é transformada em coisa- arte através do artifício do artista e é a alma deste que confere vida à pedra e a transforma em arte.
O que confere aos sapatos de Van Gogh algo desta representação em arte, diferente de ser um mero apetrecho "sapato" é esta possibilidade para além de seu caráter de coisa.
Van Gogh confere aos sapatos a apreensão da subjetividade do artista, ultrapassando à própria imagem, criando ou recriando a noção que guardamos de um objeto, permitindo distinguir o real da representação, e assumindo o caráter de transpor ao nosso imaginário  a função real do objeto para além do "ser" objeto.
Portanto, só é possível decifrar uma obra de arte e o conteúdo humano de que o artista a imprimiu, quando se descobre a  "leitura complexa que toda imagem oferece", onde a intuição apercebe-se de imediato que toda a imagem é um sinal onde, como um rosto, podemos encontrar, para além da semelhança e da beleza a inscrição de uma alma.



Outra questão a ser proposta é em relação ao "Tempo". O Tempo presente em cada obra e a faz singular no seu existir. Esse tempo que ajuda a criar novas formas de olhar, ao revelar como a obra se mantém sempre a mesma à medida exata em que se descobre sempre outra - com outras interpretações, e portanto  aberta a novos significados, que segundo Heidegger é o que faz ser o lugar "da verdade" de uma obra, da verdade que se revela sempre como um acontecimento atemporal, por gerar com este olhar a admiração e o espanto.
"O que nos parece natural é unicamente o habitual do há muito adquirido, que fez esquecer o inabitual donde provém. Este inabitual, todavia, surpreendeu um dia o homem como algo estranho, e levou o pensamento ao espanto" (Heidegger, 1990, pg. 17).
Esse espanto, ou uma abertura para o ser da obra, carrega a evidência do acontecimento da verdade na obra, o que quer dizer que é na obra que a verdade se cria, que se instaura um mundo, onde a arte, portanto, na sua essência é uma origem.

anexos e discussões compilados
por Juracy Giovagnoli dos Santos

domingo, 5 de fevereiro de 2012

DIRETRIZES E ORIENTAÇÕES

Aulas de pintura Sergio Fingermann 2012

Como nossas aulas estão começando, gostaria de repassar com vocês (e apresentar para aqueles que ingressam agora) algumas das diretrizes e orientações com relação ao funcionamento do curso que começará agora em fevereiro.

  I. Organização das aulas As aulas têm dois focos: reflexão e prática. São aulas coletivas, nas quais o aluno desenvolve um projeto poético pessoal sob a orientação do artista Sergio Fingermann.

 A orientação para cada aluno também é coletiva e individual, com indicação de bibliografia específica. Material: Os materiais utilizados durante as aulas são de responsabilidade dos alunos (telas e tintas).


Dias e horários: As aulas acontecem das 09h00 às 12h30, uma vez por semana (às terças ou quartas-feiras)#.

Calendário semestral: Aulas às terças-feiras Fevereiro Março Abril Maio Junho 7,14, 23,# 28 6, 13, 20, 27 3, 10, 17, 24 3#, 8, 15, 22, 29 5, 12, 19, 26
Aulas às quartas-feiras Fevereiro Março Abril Maio Junho 1, 8, 15, 22#, 29 7, 14, 21, 28 4, 11, 18, 25 2, 9, 16, 23, 30 6, 13, 20, 27


Tema a ser trabalho no ano:

Memória e imagem Procurar algo atrás daquilo que vemos. Interrogar: o que nunca se revela aos nossos olhos? O que está na origem? A proposta é trabalhar a noção de tempo e história como se fosse uma espécie de material, como a argila. O tempo é algo que se pode modelar; a argila é algo que pode se esculpir e fazer imagens.



  Bibliografia sugerida: ARGAN, Julio Carlo. Imagem e persuasão: Ensaios sobre o barroco. São Paulo: Cia das Letras, 2004.

MANGUEL, Alberto. Lendo imagens: uma história de amor e ódio. São Paulo: Cia das Letras, 2009. MATISSE, Henri. Escritos e reflexões sobre arte. São Paulo: Cosac & Naif, 2007


. Livros do artista:


FINGERMANN, Sergio. Fragmentos de um dia extenso. São Paulo: BEI, 2001. FINGERMANN, Sergio. Gravura: trama de sobras. São Paulo: BEI, 2007. FINGERMANN, Sergio. Elogio ao silêncio. São Paulo: BEI, 2007. FINGERMANN, Sergio. Uma aprendizagem. São Paulo: BEI, 2010.



Ver também site de Sergio Fingermann: WWW.fingermann.com.br (Seção: “Textos críticos”, textos sobre o artista) II. Pagamento Datas: Os pagamentos deverão ser efetuados impreterivelmente em toda primeira aula do mês. O aluno assume o compromisso de frequentar os 10 meses de aula no ano, com o pagamento correspondente. Aqueles que faltarem deverão efetuar o pagamento antecipado do período em que estiverem ausentes (não haverá desconto). Valores: A mensalidade é de R$ 500,00. Sergio Fingermann Tel. (11) 9347 7991 │e-mail: sfingermann@gmail.com │www.fingermann.com.br